No dia 04 de junho de 2024, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei n.º 14.879, para alterar a Lei n.º 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), no que tange às disposições sobre cláusula de eleição de foro. O objetivo da alteração legal, decorrente do Projeto de Lei n.º 1.803/2023, é para estabelecer que a eleição de foro deve guardar pertinência com o domicílio das partes ou com o local da obrigação e que o ajuizamento de ação em juízo aleatório constitui prática abusiva, passível de declinação de competência de ofício. Assim, no presente artigo, serão abordados os principais aspectos e as mudanças acerca da escolha do foro de eleição em contratos civis e empresariais.
- O que é eleição de foro?
- Quais foram as mudanças no Código de Processo Civil?
- Exceção aos requisitos para determinação da cláusula de eleição de foro.
- Quais foram as razões para a mudança legislativa?
- As alterações passam a valer a partir de quando?
O que é eleição de foro?
Eleição de foro é a possibilidade de as partes contratantes escolherem o local em que serão submetidas ações relativas às obrigações e aos direitos previstos no próprio contrato entabulado entre elas.
A competência em razão do lugar do ajuizamento de uma ação possui natureza relativa, ou seja, por buscar atender interesses particulares, permite que seja fixada e modificada por vontade das partes. Dessa forma, o foro de eleição é fixado nos mais diversos contratos civis e empresariais em cláusula específica, disposta ao final do documento.
A conceituação e outros aspectos acerca da cláusula de eleição de foro são previstas pelo Código de Processo Civil (Lei n.º 13.105/2015), especificamente no artigo 63, caput e parágrafos.
Quais foram as mudanças no Código de Processo Civil?
A Lei n.º 14.879, de 04 de junho de 2024, publicada no Diário Oficial da União em 05 de junho de 2024, com vigência imediata, promoveu alterações importantes ao Código de Processo Civil no que tange à cláusula de eleição de foro. As mudanças ocorreram na redação do artigo 63. Vejamos mais detalhes:
Com relação ao parágrafo primeiro do referido artigo, houve alteração na redação anteriormente prevista. A redação antiga previa que:
§1º A eleição de foro só produz efeito quando constar de instrumento escrito e aludir expressamente a determinado negócio jurídico.
A redação atual passa a prever que:
§1º A eleição de foro somente produz efeito quando constar de instrumento escrito, aludir expressamente a determinado negócio jurídico e guardar pertinência com o domicílio ou a residência de uma das partes ou com o local da obrigação, ressalvada a pactuação consumerista, quando favorável ao consumidor.
Com isso, para produzir efeitos, a cláusula de eleição de foro deve, necessária e cumulativamente: (a) estar prevista em instrumento escrito; (b) mencionar expressamente o negócio jurídico sobre o qual a cláusula recai; e, a partir do acréscimo na redação do referido artigo, (c) indicar foro (local) que guarde relação com o domicílio ou a residência de ao menos uma das partes ou com o local da obrigação.
Ademais, a não observância dos requisitos dispostos no parágrafo primeiro implica no que dispõe o parágrafo quinto, o qual foi inserido no Código de Processo Civil pela Lei n.º 14.879. Vejamos a redação:
§5º O ajuizamento de ação em juízo aleatório, entendido como aquele sem vinculação com o domicílio ou a residência das partes ou com o negócio jurídico discutido na demanda, constitui prática abusiva que justifica a declinação de competência de ofício.
A partir deste novo parágrafo no artigo 63, é possível compreender o que é um “juízo aleatório” e quais serão as consequências de ajuizar ação em um juízo que não possui relação alguma com o caso, quais sejam: a caracterização de prática abusiva e a possibilidade de declinação de competência de ofício pelo juiz.
Portanto, antes da alteração legislativa, as partes possuíam plena liberdade de escolha do local em que seria submetida eventual demanda decorrente do contrato, mesmo sem qualquer relação com as partes ou com a obrigação contratada. Agora, as partes devem restringir a escolha do foro em, basicamente, duas opções: 1. ou ao domicílio ou residência das partes; e 2. ou ao local da obrigação estabelecida em contrato.
Exceção aos requisitos para determinação da cláusula de eleição de foro:
O parágrafo primeiro, apresentado acima, prevê uma exceção à escolha do foro de eleição: em contratos em que há relação consumerista. Nesses casos, o foro escolhido pelas partes irá prevalecer mesmo sendo um foro aleatório, quando for favorável ao consumidor, posto que é parte hipossuficiente da relação contratual.
Quais foram as razões para a mudança legislativa?
De acordo com o Projeto de Lei n.º 1.803/2023, o intuito da alteração legislativa é evitar aleatoriedade e conduta abusiva quando da eleição de foro. Assim, com a aplicação dos novos dispositivos legais, há a garantia de que a escolha do local tenha uma ligação concreta com as partes envolvidas ou com o objeto do contrato.
A escolha de juízo aleatório – em razão da maior celeridade no julgamento das causas ou em razão do favorecimento às partes – vinha causando acúmulo de ações judiciais em determinados locais e, por conseguinte, a prejudicialidade ao andamento processual célere e à eficácia da justiça.
Ademais, as alterações buscam a redução dos litígios que têm como objeto discussões acerca da cláusula de eleição de foro. A limitação da escolha do foro de eleição também tende a promover aos contratantes negociações mais tranquilas e transparentes, reduzindo os conflitos causados por dúvidas da aplicação ou não da cláusula de eleição de foro posta em contrato.
Assim, de modo geral, a mudança visa a promover maior segurança jurídica, clareza, previsibilidade e eficácia à cláusula de eleição de foro posta em contrato.
As alterações passam a valer a partir de quando?
A Lei n.º 14.879/2024, possui aplicação imediata, ou seja, entrou em vigor no momento em que foi publicada. Com isso, as alterações legislativas passaram a produzir efeitos a partir do dia 05.06.2024, data em que ocorreu a publicação da referida Lei no Diário Oficial da União.
Portanto, as alterações inseridas no Código de Processo Civil já estão valendo para todos os contratos civis e empresariais que serão firmados e aqueles que, eventualmente, terão a cláusula de eleição de foro alterada.
Conclusão:
Dessa forma, a partir da alteração legislativa explicada acima, verifica-se que há limitações às partes contratantes na pactuação do lugar, ou foro, em que serão submetidas eventuais ações relativas às obrigações e aos direitos previstos no próprio contrato.
Assim, é necessário que, nos novos contratos e nas revisões dos contratos já firmados, as partes indiquem um foro que guarde relação com o domicílio ou a residência de ao menos um dos envolvidos no negócio jurídico ou com o local da obrigação firmada, a fim de garantir a validade da cláusula de eleição de foro.
Ademais, considerando que a nova redação do artigo 63, do Código de Processo Civil, já está vigente, recomenda-se a revisão dos contratos civis e empresariais já firmados, a fim de verificar se atendem aos novos requisitos dispostos em Lei e evitar problemas contratuais futuros.
Texto escrito pela advogada Gabriela Regina Nardi Picoli